Se querem todos me dizer que é ridículo, que o amor não é importante e coisa e tal, pois saibam todos, meus senhores, que eu não estou nem aí. Já pude ter a revelação assustadora dos poderes do mal. Não cabe a nós encobrir a verdade com histórias bonitas. A nós, que queremos o bem e o amor, nos cabe lutar ativamente por ele. Por piegas e ridículo que possa soar, que nós vivamos, no presente, que é tudo que temos, o amor. Que nós respondamos com paz à violência, que nós dancemos apesar de tudo. Que a gente ria na cara de tudo isso e tenha a audácia de ainda nos amarmos, linda e descaradamente.
amor e outros delírios
escrever pra que, se ninguém vai ler
sábado, 8 de setembro de 2012
terça-feira, 24 de julho de 2012
eu bem que queria que as palavras dessem conta de tudo
O mal das pessoas é levarem-se a sério de mais, levaram a
sério demais suas palavras. Tudo começa quando a gente deixa de jogar conversa
fora, de falar por falar, de achar bonito só por achar, e passa a querer
encontrar explicação para tudo, passa a ver em toda e qualquer circunstância a
confirmação de nossos pensamentos, de nossas teorias e explicações pra todas as coisas. E
o movimento se inverte. Englobamos o mundo nas nossas idéias, ao invés de
vivenciarmos o mundo e depois formarmos uma idéia sobre ele. As palavras nos
dominaram. Já somos reles e humildes servos, que atendem a todos os caprichos
da linguagem. Estamos perdidos e não há saída. Aí amanhece e anoitece e
sucedem-se as estações. E a gente envelhece e morre. E fim.
sexta-feira, 6 de julho de 2012
sem título
Aquele velho desejo quente lhe subia pela garganta, desejo
de violetas que violam a página, aquele branco da página, aqueles violões
I
entardecer de sombras úmidas,
Finalmente aquele grito bonito
que não se pode conter
A dolorosa beleza de sentir o veneno
que os olhos não veem
o desaviso do sangue nas cartas
o desvario de noite em teus olhos
depois nossas plumas caídas
No quintal das manhãs
Finalmente a manhã a romper nossa face
A nascer-nos bem no meio da cara
E corações quentes
Dos verões de nossos lençóis
Renascendo
II
violetas dançando caladas
uma valsa de fogo e fumaça
com a benção dos seres que habitam a floresta
desde que o mundo é mundo
povoando a escuridão da noite
e colorindo o dia
sendo a própria respiração dos bichos
sendo a própria lagarta que escala o galho úmido
sendo a fumaça no cachimbo do caboclo
o ar molhado turva a vista do visitante
seja bem vindo à festa na floresta, o pajé diz
uma velha senhora agachada te olha e sorri
carrega na testa a ancestralidade do mundo
no ventre todos os seres paridos
uma luz te brilha no
olho e ao redor da cabeça
é uma luz imensa, de tamanho infinito
estranhamente aconchegante e familiar
você chegou em casa
quinta-feira, 28 de junho de 2012
às duas da noite
Entrego-me
à sordidez da minha preguiça, escrevendo sem saber pra quê, saboreando a música
e a fumaça. No céu, a lua se faz cada dia maior enquanto nós continuamos a ser
pequenos. Neil Young adentra na minha noite e docemente deixo tudo pra depois. O dia hoje não foi exatamente produtivo, e nem totalmente
desperdiçado. A cidade dorme quieta na janela, como de costume, às duas da
noite, e eu cheia de nostalgia das horas perdidas. Neruda me dizia agora pouco
que nunca compreendera porque chamavam duas da manhã. Estou cheia, de tanto
engolir as horas caladas da noite. Meus dedos regurgitam palavras esquecidas
nos confins do corpo, que lembra da vastidão do mundo e logo se esquece. As
notas musicais envolvem suavemente a noite outonal. No silêncio, dançam
personagens de tempos nunca conhecidos, que se amaram em cidades distantes.
quarta-feira, 27 de junho de 2012
a esperança maldita
A primavera
sanguinária dos bosques despertou.* Esse verso pairava na cabeça de Roberto
naquela noite. Era o segundo dia de primavera e ele ainda não sentira toda
aquela leveza, toda aquela alegria e esperança que emanavam da terra
costumeiramente por esses dias. Não sabia ao certo se era culpa sua, se estava
mais insensível com o passar dos anos ou se era culpa mesmo do aquecimento
global, que misturava as estações e deixava tudo meio caótico. Lia num livro naquela mesma tarde alguns
devaneios sobre a esperança. Que era ela talvez o único sentimento externo a
toda humanidade, algo que sentimos, mas não nos pertence. Que pertence à
própria vida, é a expressão mesma da vida que faz com que os seres que padecem
dos mais infames sofrimentos sigam a viver sobre a terra por vontade própria,
por essa coisa que os alimenta desde dentro, que vem da terra, do chão, das
profundezas e que sobe, sempre ascendente, sempre pra fora, pra frente, pra
vida, com toda a sua luz verde que cega os olhos dos videntes. Saiu subitamente
da sacada e foi revirar suas coisas, montes de papel cheios de anotações, em
busca daquele poema. Buscava mesmo a própria esperança. Encontrou.
*verso de pablo neruda
terça-feira, 19 de junho de 2012
despropósito
É impressionante que só tendo uma palavra tenha-se tudo e
daí se sucede essa coisa da vida andar pra frente e uma coisa levar a outra e
assim numa sucessão sem fim de qualquer coisa absurda que a gente não desiste
de tentar engavetar freneticamente ou pelo menos etiquetar e agrupar em
categorias para que se sinta seguro de viver em um mundo coerente e sem saber
que isso é a última coisa que o mundo pode ser. e enquanto isso o mundo segue a
esbanjar sua indiferença perante a tudo que a gente possa pensar e tentar dizer
ou qualquer coisa que o valha e segue sendo mundo e a gente tem que aceitar o
absurdo que é o sol nascer todo dia mais ou menos na mesma hora e no mesmo
lugar e tentar atravessar os dias todos a cuidar e carregar esse corpo que
deram pra gente e que a gente não é, sem saber de nada e a saber unicamente que
nunca poderemos saber coisa alguma e que é tudo uma questão de dar um passo
adiante ou pro lado ou para trás e que no fundo nada disso faz a menor
diferença e que estamos todos presos na insanidade que é a vida e o mundo. E
não importa se dentro de cada um é noite que o sol radiante vem.
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