A primavera
sanguinária dos bosques despertou.* Esse verso pairava na cabeça de Roberto
naquela noite. Era o segundo dia de primavera e ele ainda não sentira toda
aquela leveza, toda aquela alegria e esperança que emanavam da terra
costumeiramente por esses dias. Não sabia ao certo se era culpa sua, se estava
mais insensível com o passar dos anos ou se era culpa mesmo do aquecimento
global, que misturava as estações e deixava tudo meio caótico. Lia num livro naquela mesma tarde alguns
devaneios sobre a esperança. Que era ela talvez o único sentimento externo a
toda humanidade, algo que sentimos, mas não nos pertence. Que pertence à
própria vida, é a expressão mesma da vida que faz com que os seres que padecem
dos mais infames sofrimentos sigam a viver sobre a terra por vontade própria,
por essa coisa que os alimenta desde dentro, que vem da terra, do chão, das
profundezas e que sobe, sempre ascendente, sempre pra fora, pra frente, pra
vida, com toda a sua luz verde que cega os olhos dos videntes. Saiu subitamente
da sacada e foi revirar suas coisas, montes de papel cheios de anotações, em
busca daquele poema. Buscava mesmo a própria esperança. Encontrou.
*verso de pablo neruda
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